Abstinência
"No começo, o alívio fora maior que qualquer outra coisa. A separação fizera dela uma mulher livre. Não livre dele. Livre da angústia que sentia a cada vez que pensava se era ou não amada. Agora ela tinha certeza de que não. E, naqueles primeiros dias, não sentiu tristeza, sentiu-se feliz por ter acabado com a dúvida. Acreditou realmente que seria sempre assim. Mas, ao fim da primeira semana, finalmente o efeito da anestesia passou. A cabeça ainda sabia que tinha feito um ótimo negócio, até mesmo o coração sabia, mas o corpo começou a revoltar-se e a clamar por ele. Cada canto da sua pele, cada poro, cada célula ansiava pelo contato dele. A boca pedia o seu beijo. O nariz queria o perfume dele. Já não era uma necessidade emocional, mas sim física. Agora entendia o que um dependente químico sentia quando entrava em crise: sabia o mal que a droga lhe fazia, mas o corpo falava mais alto que a razão.
Enfim, havia chegado o momento da grande dor. Finalmente, a fantasia de que ainda havia paixão entre eles começava a fazer falta. A grande dor que ela não tinha conseguido sentir. Talvez, depois que a dor passasse, o ciclo se completasse e ela conseguisse esquecê-lo de vez. Acabara a sua ilusão de que iria passar por tudo aquilo sem sofrimento, só com alívio.
Quanto tempo mais ela teria que esperar até que tudo realmente terminasse?"