Viva o igualCheguei no supermercado novo. Novo pra mim, porque eu nunca tinha ido lá. Fui pra conhecer, mas logo que eu cheguei, me lembrei por que eu odeio conhecer novas coisas. Logo de cara, não conseguia achar uma maldita cestinha. Fezes. Eu morrendo de fome e perdendo preciosos segundos procurando aquilo. Até que vi uma. Fui caminhando em direção ao objeto, sem perceber nada em volta, determinada. Era eu e a cestinha. O mundo todo sumiu.
Só que, pentelhésimos de segundos antes, um sujeito de terno e gravata pegou a cestinha. Despertei do transe, enfiei a viola no saco e já ia me afastando, quando ele disse:
- Você queria isso aqui?
A cestinha. Esse era o momento em que ele iria dizer: “então fica com ela, eu arrumo outra”, porque essas coisas fazem parte do cavelheirismo do homem. Ainda mais um homem distinto, de terno e gravata, devia ser pai de família. Eu disse:
- Queria...
E, juro, involuntariamente, fiz um movimento de pegar a cestinha da mão dele. Cara, pra mim era tão óbvio que, se ele perguntou, ele ia me ceder, que eu não pensei na outra hipótese. Foi um gesto automático. Quase que no mesmo momento em que eu fiz o movimento de pegar a cestinha, ele fez o dele... de ir embora com a cestinha! Morri de vergonha, porque ficou parecendo que eu estava fazendo pressão pro cara ser cavalheiro. Quis enfiar minha cara no meio das alfaces da gôndola. Maldita hora em que eu resolvi experimentar o novo supermercado. Imediatamente, me afastei. Aí o cara me estendeu a cestinha e disse:
- Toma, pode ficar.
Eu mega power combo constrangida disse:
- Não, não precisa.
E ele:
- Não, fica.
E saiu andando, ao mesmo tempo em que dizia, aparentemente sincero, meio com ele mesmo:
- Seria uma grosseria enorme da minha parte...
Pelo jeitão do cara, acho que realmente a ficha caiu, mas que situação!
Depois do momento king, fui fazer minhas comprinhas. Não achei o iogurte que queria. Não achei o pão que queria. Não achei o queijo que queria. Que supermercado merda! Vou embora daqui agor...
Não! O sujeito de terno estava na fila. Eu não podia passar por ele e sair sem nada depois de ter ficado com a cestinha dele! Estava presa no supermercado para sempre. Ou até ele ir embora. Pensei realmente em esperá-lo sair, mas foi me dando uma gastura, uma fome, uma agonia, tudo junto misturado e aquilo começou a não fazer mais sentido. Coloquei a cestinha da discórdia num cantinho, tracei uma linha reta, saí atropelando as pessoas e ganhei a rua. Parecia que estava roubando alguma coisa. Mas acho que o moço não me viu.
Viva o mercado de sempre. Fica embaixo do meu prédio. E tem pilhas de cestinhas na entrada.