Bichos estranhosO papo era sobre acreditar ou não em Papai Noel. A maioria na mesa tinha acreditado quando era criança. Eu não. Eu só acreditava em fada. Inclusive um dos
traumas da minha infância foi ter descoberto que a fada não tinha transformado em pedra uma tartaruguinha que eu tinha, e sim que Mamãe Joselita tinha soltado ela num terreno baldio porque ouviu falar que tartarugas estavam “dando doença nas crianças”. Foi um duro golpe pra mim que, naquela época, ainda tinha um coração.
Contei isso e aí o papo descambou para bichos que as pessoas já tinham tido. Suely do Caminhão disse que uma vez teve uma tartaruga também, mas era uma tartaruga grande. Chamava Jorge Tadeu. Um dia Jorge Tadeu estava muito quieto. Foram olhar mais de perto e ele estava com os olhos cheios de formiga. Tinha morrido e ninguém tinha notado. Ai, meu São Francisco das Histórias Tristes. Que agonia! Quando eu pensei que essa tinha sido a história campeã, Veia Saltada declara, solenemente:
- Eu criava baratas.
Anh? Ba-ra-tas? Aquele bicho castanho e nojento que desaparece embaixo dos móveis?
- Como assim?
- É, eu criava baratas. Eram baratas limpinhas que não ficavam andando em qualquer lugar. Que eu tinha criado desde pequenas. Era as minhas baratas.
Ah, que bonito. Limpinhas.
E quando você pensa que a história não pode ficar pior...
- Começou porque eu era muito curioso. Eu tinha uns escorpiões e umas cobras, esses mortos, claro, em vidros. Um dia, achei uns ovinhos e resolvi colocar dentro de um pote, para ver o que era. Nasceram várias baratinhas.
Aí... que nojo! Baratinhas saindo dos ovinhos. Juro que até aquele dia essa imagem nunca tinha me passado pela cabeça. Mas agora passou. E eu podia ter passado sem essa.
A história continuou...
- Um dia, eu fui viajar. Deixei água e comida para as baratinhas...
Pára. Água e comida? Eram praticamente cachorros. Cachorros marrons, cascudos e pequenos. Quase Chiuauas.
Perguntas óbvias:
- O que barata come? Barata bebe água? É bonito um mundo com baratas?
Mais coisas sobre as quais eu nunca deveria ter pensado. Acho que a minha vida seria melhor se eu tivesse continuado a associar barata apenas a spray de inseticida, chinelos e gritos histéricos.
- Eu as alimentava com açúcar. E barata bebe água, sim.
Que coisa...
- Mas então... fomos viajar. Acho que deixei pouca comida e água, porque quando cheguei elas estavam secas dentro do vidro, mortas. Começou como uma brincadeira, mas quando eu vi que elas tinham morrido fiquei triste.
Ô, dó. Tinha pegado amor com os bichos.
Quando a gente pensa que tem uma história bizarra, aí vem alguém e conta uma coisa pior ainda. Tudo sempre pode piorar. E nada nessa vida é simples. Nada.