PISANDO NA SAPUCAÍ – PARTE FINALO domingo de carnaval, dia do desfileEntão, finalmente, chegou o dia. Eu estava em pânico de sair de casa sozinha, andar até o metrô fantasiada pagando mico e ainda carregando todas aquelas coisas pesadas. Felizmente, Francesa Egípcia, minha amiga assessora para carnavais aleatórios, gentilmente se ofereceu pra vir até aqui me ajudar a vestir e ir comigo à concentração. Graças a Deus, porque eu teria surtado sozinha quando um dos braceletes presos à fantasia descosturou. Isso tinha que acontecer justo comigo, que logo despiroquei achando que a gambiarra que fizemos com esparadrapo (porque eu não tenho agulha e linha em casa) iria cair na hora e eu não poderia desfilar.
Depois de encontrar com Medulinha, Veia Saltada, Kátia Lisa e Noiva do Ano e tirarmos muuitas fotos, chegou a hora de nos prepararmos pra desfilar. Até que passou rápido: logo estávamos andando da concentração até a passarela do samba. Quando pisei na avenida, esperava sentir uma emoção que fosse fazer todo o perrengue dos ensaios, da fantasia pesada, da sandália 40, da logística da chegada ao sambódromo, tudo isso valer a pena. Mas preciso dizer que não senti. Só o que eu sentia era que o adereço de mão realmente devia pesar 15 quilos, e eu tinha que ficar trocando de braço toda hora, e que o chapéu, aquele que não cabia na minha cabeça, não cabia MESMO, e fazia uma pressão que me fez lembrar aquele filme da máscara de ferro com o Leonardo de Caprio. Pra piorar a situação, o carro com a Ana Botafogo ficava bem em frente à nossa ala, fazendo um paredão gigantesco. Além de ninguém olhar pra gente, porque só olhavam pra ela, rolou uma claustrofobia, porque com isso não dava pra saber em que ponto da Marquês de Sapucaí estávamos.
Não sei se foi aquele paredão, ou as pessoas vestidas todas iguaizinhas com aquele monte de esplendores com penas se batendo, ou o chapéu que não cabia na cabeça, ou o adereço de mão de 15 quilos, ou todas essas coisas que vêm juntas, mas sei que foi me dando uma gastura, uma agonia... e pronto: comecei a passar mal. Tudo o que conseguia pensar era que adoraria saber em que ponto do desfile estava, pra saber se estava chegando e, assim, ia aguentar chegar até o fim sem desmaiar, mas a merda do carro alegórico tapava toda a minha visão. Pensava muito também em tirar aquele chapéu. E em como me tirariam dali se eu desmaiasse. E se eu ia ser aquela que ia aparecer na televisão porque passou mal. Graças ao bom Deus, fiquei livre desse vexame, porque consegui chegar até o fim. Assim que tudo acabou, Medulinha olhou pra mim e disse: “Você está passando mal, né?” Aí eu vi que a coisa estava feia mesmo, porque eu nem estava conseguindo disfarçar. A sorte é que, sem o chapéu na cabeça e sem o paredão na minha frente, e com o adereço devidamente apoiado no chão, comecei a melhorar na hora e estava pronta pra jornada de volta pra casa.
Voltando pra casaAndamos muuuuito até o metrô. Qui-lô-me-tros até a estação aberta mais próxima. Fui montada, com o esplendor preso nas costas, porque era a única forma de carregar aquilo àquela altura do campeonato. Aí veio a parte mais divertida de toda essa história: as pessoas pedindo pra tirar foto comigo. Ouvi até que eu estava “linda, parecendo um anjo”. Gente, luxo e riqueza. Me senti a própria atriz da Glóbo.
Quando cheguei aqui no prédio, tive que pedir ao porteiro pra me ajudar a desamarrar a fantasia, um sujeito da madrugada que eu nunca vi na vida, mas que era a única pessoa disponível no momento. Santo homem. No caminho para o elevador, pra completar a minha noite de prazer e felicidade, lembrei que o prédio tinha passado por uma dedetização naquele dia. Não sei, mas acho que devo ter lembrado disso porque estava CHEIO DE BARATAS MORTAS NO CHÃO. A fantasia tinha um véu que arrastava no chão feito uma cauda de vestido de noiva, então eu tive que ir andando e desviando como podia dos cadáveres, sem conseguir levantar a tal cauda porque, àquela altura, eu estava carregando o esplendor na mão, aquele que o porteiro que ajudou a tirar. Cheguei em casa, tirei e taquei tudo no chão e confesso que não tive coragem de olhar pra ver se tinha levado alguma barata morta pra dentro da minha sala embolada na roupa que arrastava. Olha, a vida do babaca é atribulada.
No dia seguinte, eu estava toda dolorida. Um ombro doía mais que o outro, não sei se o esplendor pesou mais de um lado, os braços doíam de carregar o adereço e fiquei com a testa doendo como se tivesse batido com a cabeça. Fui tomar um banho de mar pra dar uma renovada.
Passou. Não me arrependo, porque acho que essa é uma experiência para se ter, em sendo carioca e tendo crescido vendo desfiles das escolas de samba e tal. Mas ano que vem me procurem em algum balneário ou nas montanhas. Montanhas é uma boa idéia. Lá em cima. Nas tundras geladas da Noruega. É lá que eu vou estar.