PISANDO NA SAPUCAÍ – PARTE IINossa fantasia superprática de bolsoEnfim, chegou o dia de buscarmos a fantasia. Até então, não tínhamos idéia de como era. Podia ser só um tapa sexo. Como não pagamos por ela, não vimos antes, e a escola fez o maior mistério. Quando chegamos lá, vimos que a coisa era gigantesca. Minha fantasia tinha tudo: chapéu (que não cabia na cabeça), esplendor (aquele negócio que fica nas costas do folião, cheio de penas, igual a um pavão), adereço de mão (uma coisa feito um cetro que na avenida pesaria 15 quilos), bracelete, saia, top, sandália (que me deram tamanho 40). Pra trazer todo esse trambolho pra casa, tive que me atirar dentro de um táxi.
Quando cheguei aqui, fui, toda pimpona, vestir a fantasia, pra ver se precisava fazer algum ajuste, e, principalmente, matar a curiosidade de como aquilo ficaria em mim. Quinze minutos depois, percebi que não seria assim tão simples, pícara sonhadora. Eu não conseguia decifrar como se colocava aquilo. Onde enfiava a cabeça, os braços, como amarrava... Mais quinze minutos e eu decidi que, provavelmente, o problema devia ser eu. Convenhamos, não sou a pessoa mais jeitosa do mundo. Já deixei de comprar algumas roupas porque tinha certeza de que não iria conseguir vestir sozinha. Então liguei pra Medulinha, a única do grupo na mesma ala que eu, crente que ela iria rir de mim e dizer que era muito fácil. Mas não. A coitada estava na mesma situação que eu, brigando com a fantasia, sem conseguir ter idéia nem de por onde começar. E olha que o pai dela estava ajudando.
Só conseguimos entender como vestia aquela merda quando Medulinha, no dia seguinte, se despencou até a quadra da escola e conseguiu falar com a nossa coordenadora de ala. Surpreendentemente, duas palavrinhas fizeram com que conseguíssemos vestir o troço. Bom, pelo menos começou a fazer sentido, mas ainda assim estabeleceu-se uma polêmica entre nós duas sobre como prendia a gola. Horas gastas tentando entender, e eu vou adiantar pra vocês: só foi colocada certo lá no dia, com assessoria de outros cálegas componentes.
A sandália 4 números maiorO estresse pré-desfile estava longe de terminar. Lembram da sandália 40? Pois é, não dava pra pisar na passarela do samba com uma sandália 40. Então, eu e Medulinha, companheiras de luta, fomos à caça de um sapateiro que pudesse fazer alguma coisa – qualquer coisa – pra que aquilo ficasse usável pra duas moças de pezinhos 36, que mereciam o sapatinho de cristal da Cinderela, e não aquela pracha de surf long board. A de Medulinha era menor que a minha - número 39. Quando a tiazinha que distribuía as fantasias deu a 39 pra ela ainda disse que ela teve sorte porque ainda tinha uma pequena: 39. Era pra rir naquela hora ou quando chegássemos em casa?
Enfim, sobre o sapateiro: fomos primeiro em um velhinho português, com fama de ser fofo. Mentira. Sapateiro nenhum é fofo. Como todo português, ele, Joselito, olhou aquilo e disse: “Mas isso não é do tamanho de vocês. Isso é de homem! Vocês vão cair”. Isso porque já chegamos lá explicando a situação, dizendo que era de uma fantasia, que foi de graça, que tinham dado maior que o nosso pé. Ele ignorou toda a explicação e ficou repetindo isso e dizendo que não havia nada a fazer. Então, tá. Fomos a um outro moço, que nos olhou com uma cara de sem saco, resmungou que aquilo era muito grande pra gente, que teria que refazer toda a sandália, mas disse que podia fazer. Não sem antes, claro, dar uma sacaneada, dizendo que só ia poder entregar dia 23 de fevereiro, um dia depois do desfile. Porque esse não é português, mas é filho de português, e todo filho de português também guarda algo de Joselito em seu coração.
(CONTINUA...)