Cilada level combo (ou "Nada é óbvio")
Como eu lembrei
Daqui a alguns meses, em setembro, farei uma viagem nas férias com uma amiga e, em um dos dias, vamos precisar passar a noite em algum lugar pra depois seguir pro nosso destino final. Ela ficou de ver o hotel, que não precisa ser nada muito bom, já que é só pra dormir, e me mandou um e-mail com duas opções. Eu disse: "Olha, pra mim está tudo lindo e ótimo, só queria que você pedisse duas camas de solteiro". Porque eu sei que tem gente que não liga, mas eu tenho TOC de dividir cama, durmo mal, às vezes passo a noite em claro. Enfim, tenho manias e uma delas é essa. Minha amiga respondeu: "Sim, CLARO que eu vou pedir duas camas de solteiro!". E aí eu lembrei, caros escassos leitores que me restaram, que nada é óbvio nessa vida. Depois que eu fui em uma viagem e não perguntei nada. Porque achava óbvio que grandes ciladas seriam compartilhadas antes. Tadinha de mim... pícara que sonha.
Back to janeiro
Janeiro... vivia eu uma linda história de amor. Mentira, eu estava de rolo com a criatura. Mas era um rolo mais ou menos estruturado, um rolo de todo fim de semana, um rolo assim dois ponto zero. Criatura me chamou pra viajar com uns casais amigos dele pra casa de praia dos pais dele, em uma localidade da Região dos Lagos do Rio de Janeiro muito apreciada por surfistas e suburbanos em geral, não necessariamente nessa ordem. Disse que queria que eu fosse, foi todo fofo e eu não resisti. Fiquei meio bolada porque não conhecia ninguém, mas pensava que pelo menos ficaria perto dele, que teria três noites com ele. Não pensei em perguntar como era a casa, porque - imaginei - se ele estava me convidando, havia infraestrutura. Quando alguém convida você pra casa de praia, não se pergunta: "Mas como é a sua casa, é ajeitadinha?". Não pega nem bem e eu sou educadinha. TADINHA DE MIM. Pícara sonhante.
Por onde eu começo?
Acho que posso começar pelo DESESPERO TOTAL E ABSOLUTO, tipo ataque de pânico, que senti quando cheguei na casa e percebi que não ia ter um quarto só pra mim e que só tinha um banheiro. Arrependimento instantâneo, tipo miojo. Tive vontade de ir embora naquele momento. Eram quatro casais e uma criança. Pensem: eu, numa casa com nove pessoas e um banheiro. Euzinha. Phyna. A cara da riqueza. Criada pelas freiras cegas que cultivam morangos na Dinamarca. Alimentada a leite de cabras albinas. Que tinha acabado de voltar de um resort em Búzios.
Nove pessoas, dois quartos. A configuração foi: o casal que levou uma criança de dois anos foi o que ficou em um quarto sozinho, que tinha uma cama de casal e uma de solteiro. O resto, maluco, dormiu amontoado: dois casais dividindo um quarto e eu e Criatura NO CHÃO DA SALA. E isso porque um outro casal que ia nao foi. Onde eles iam dormir, pergunto eu? Não imagino.
Leitores queridos. Eu nasci velha pra essas coisas, VELHA. Alguns dirão que eu estou exagerando, que tem gente que dorme acampado no meio do mato pra ouvir os grilos cricrilando, mas eu não. E, não, não tenho interesse. Gosto de cama bem feita, com banheiro limpo e sem uma barata morta no chão do box. "Fernanda, tem uma barata morta aqui, você tem medo?" Medo de barata morta? Não, mas não tenho o hábito de tomar banho dividindo espaço com um cadáver baratal no chão. Dá para REMOVÊ-LA?
Na primeira noite, eu devo ter dormido, sei lá, no máximo umas duas horas depois que já tinha clareado. Durante a madrugada quando eu estava quase dormindo a criança começou a chorar. Aí quando eu tava quase dormindo de novo tocou um dos muitos celulares largados na sala (também conhecida como meu quarto). E assim foi. A sorte é que pelo menos as pessoas, amigos de Criatura, eram legais, porque não tinha pra onde fugir. Nem pra um quarto eu podia ir pra ler porque não tinha um quarto, os quartos eram dos outros. Problem?
New York, mamis? Cêjura?
Mamãe Joselita, pândega, quando eu - finalmente de volta a minha doce casa - contei toda a história, disse que se lembrou de que quando eu fui pra Nova Iorque passei por uma situação assim, de ficar meio mal instalada. Foi. Só que a diferença é que eu estava EM NOVA IORQUE. As pessoas acham maneiro ir pra Região dos Lagos nesse esquema! Tava todo mundo achando tudo normal, juro, as pessoas estavam felizes lá. Eu ficava olhando aquilo tudo e pensando que a casa de praia que eu conheço tem três banheiros e um quarto pra cada um. Que, tipo, eu queria minha mãe. A mesma que depois teve a audácia de lembrar da minha viagem pra Nova Iorque enquanto eu contava a história mais bizarra pra ela. Eu já mencionei que estava chovendo e eu nem fui à praia?
Nada é óbvio
Os defensores dos acampamentos ainda estão murmurando, eu sei, mas aí vem a parte do nada é óbvio. Reflitam. Vocês convidam a pessoa com quem vocês estão saindo (seu rolo 2.0) para uma viagem. Nessa viagem, não haverá um quarto para vocês dois: a opção é chão da sala ou dividir um quarto com outro casal. O que vocês fazem? AVISAM ANTES pra pessoa que o esquema é esse. Porque aí ela vai sabendo - ou não vai.
Mas não. Nada é óbvio. É por isso que agora eu pergunto. Pergunto como é a casa. Qual o lance da parada papo reto luminosa shock de monstro. Tem cama? Tem quarto? Tem barata no chão? Alguém vai dizer que eu uso o shampoo errado? Essas coisas que acontecem comigo.
Pronto. Falei. Tô leve, que nem as brumas de Avalon. Onde - acho - não tem internet. E também se tiver, né? Então.